Introdução

Abrir ou fechar ao domingo é uma daquelas decisões que mexem com tudo: equipa, vendas, concorrência, família e até com a forma como a marca é percebida pelos clientes.

Não há resposta óbvia. Em muitos países europeus, as regras foram sendo flexibilizadas ao longo dos anos, com resultados diferentes em função do tipo de loja, da localização e dos hábitos de consumo. cep.lse.ac.uk+1

O objetivo deste artigo não é dizer se “deve” ou “não deve” abrir ao domingo, mas dar informação e enquadramento para quem tem de decidir.

1. O que mostram estudos internacionais sobre comércio ao domingo

Vários estudos analisaram o impacto de liberalizar o comércio ao domingo (ou de o restringir) em países como Canadá, Alemanha, Países Baixos e Reino Unido. Os principais pontos em comum:

1.1. Vendas totais crescem pouco, o que muda é a distribuição

Em muitos casos, quando se passam a abrir aos domingos, as vendas da semana não explodem – o que acontece é um desvio: parte das compras que seriam feitas noutros dias passam para domingo. ResearchGate+1

Ou seja: o mercado não cresce de forma proporcional às horas extra. A semana fica mais espalhada.

1.2. Emprego tende a aumentar, mas sobretudo em part-time

Estudos no Canadá e na Alemanha mostram que a liberalização dos horários (incluindo domingos) levou a um aumento de emprego de cerca de 3–4% em média no retalho, sobretudo através de mais contratos de tempo parcial, enquanto o emprego full-time se mantinha estável. sciencedirect.com+1

Isto é positivo do ponto de vista de criação de postos de trabalho, mas levanta questões sobre rotatividade, estabilidade e gestão de equipas.

1.3. Consumidores valorizam a liberdade de escolher quando comprar

Um estudo com dados de localização (GPS) em zonas com restrições ao domingo concluiu que limitar o comércio nessa manhã gerava um “custo escondido” para o consumidor: mais deslocações, compras em horários menos convenientes e, em alguns casos, desvio de compras para outras zonas. cepr.org+1

Quando se abre, as pessoas não compram necessariamente mais – mas compram quando lhes dá mais jeito.

1.4. Pequenas lojas podem perder para grandes superfícies

Durante o período em que o Reino Unido suspendeu temporariamente as restrições dominicais para grandes lojas (Jogos Olímpicos de 2012), um estudo com mais de 3.000 pequenas lojas concluiu que estas perderam vendas na área de influência de grandes superfícies que passaram a abrir mais tempo ao domingo. keepsundayspecial.org.uk+1

Ou seja: se todos abrirem, o bolo não aumenta muito, mas a fatia de cada um muda – geralmente a favor de quem tem mais escala.

1.5. Nem todos os comerciantes estão satisfeitos

Num inquérito na Grécia, cerca de 75% dos comerciantes declararam-se insatisfeitos com medidas que aumentaram as aberturas ao domingo e 64% consideraram os custos proibitivos; entre 40% e 50% das lojas nem sequer conseguiam suportar abrir. Eurofound

Ao mesmo tempo, associações de centros comerciais e grandes operadores alertam que restringir horários teria impacto negativo na atividade económica e no emprego. Essential Business

2. “E se o governo fechasse tudo ao domingo?”

A tua intuição está certa: se todos fossem obrigados a fechar, ninguém poderia “armar-se em esperto” e roubar clientes ao vizinho do lado.

Do ponto de vista económico, os dados sugerem que:

• Se todos fecham ao domingo, grande parte das compras é redistribuída pelos outros dias – o consumo anual muda pouco. ResearchGate

• Se uns abrem e outros não, as vendas de quem fecha podem ser desviadas para quem está aberto – especialmente em zonas onde o cliente tem várias alternativas próximas. keepsundayspecial.org.uk+1

O problema é que a decisão, na maior parte dos casos, não é do governo – é tua. E é aí que a coisa complica.

3. Quanto se pode perder (ou não) em vendas ao fechar ao domingo?

Aqui é preciso ser honesto: não há um número mágico que sirva para todas as lojas. Mas podemos raciocinar com base em alguns princípios:

1. Perfil do cliente

   • Se tens um público que trabalha muito durante a semana e usa o domingo para fazer compras, a probabilidade de perder vendas é maior.

   • Se a tua loja está numa zona muito turística ou de lazer ao fim-de-semana, o domingo pode ter um peso relevante.

2. Peso do domingo na tua faturação atual

   • Lojas que já abrem sete dias conseguem ver facilmente qual a percentagem de vendas de domingo.

   • Se o domingo representa, por exemplo, 12% da faturação semanal, fechar significa renunciar a essa fatia se não houver compensação nos outros dias.

3. Capacidade do cliente de mudar de dia

   • Em bens não urgentes (moda, lifestyle, decoração), muita gente consegue adiar a compra.

   • Em bens de conveniência, alimentação, última hora, o cliente tende a ir a quem estiver aberto.

4. Concorrência direta

   • Se o vizinho direto abre ao domingo e tu fechas, o risco não é só perder a venda desse dia – é perder o cliente para o futuro, porque ele cria novo hábito.

Em resumo:

Se todos fechassem, os estudos sugerem que a perda líquida anual não seria dramática.
Se uns abrem e outros não, a questão deixa de ser “perder domingo” e passa a ser “ceder lugar na cabeça do cliente”.

4. Vantagens de abrir ao domingo

• Conveniência para o cliente – quem não pode ir em dias úteis ganha uma alternativa. cepr.org+1

• Possível aumento de emprego, mesmo que sobretudo em part-time. sciencedirect.com+1

• Mais visibilidade da marca em zonas de turismo, centros comerciais e retail parks.

• Diluição do fluxo ao longo da semana, o que pode reduzir picos de sábado.

• Proteção competitiva em relação a quem já está a abrir.

5. Desvantagens de abrir ao domingo

• Custos laborais mais elevados, em muitos casos (acréscimos por trabalho ao domingo, folgas compensatórias, etc.).

• Maior complexidade de escalas, com impacto na motivação e no equilíbrio vida pessoal/trabalho da equipa.

• Risco de “abrir só para não ficar atrás”, sem que o domingo cubra plenamente os custos. Muitos comerciantes referem que abrir ao domingo é simplesmente demasiado caro face ao retorno. Eurofound

• Pressão sobre pequenos retalhistas, que podem ver clientes desviados para grandes superfícies com mais meios. keepsundayspecial.org.uk+1

6. Um modelo simples para decidir

Em vez de discutir a partir de opiniões, podes transformar a decisão em números + critérios qualitativos.

1. Mede

   • Quantos clientes entram ao domingo (se já abriste antes, ou num teste).

   • Ticket médio de domingo.

   • Custo total desse dia: salários + acréscimos + energia + segurança + limpeza.

2. Calcula a margem de contribuição de domingo

   Margem de contribuição = Vendas de domingo – Custos variáveis de domingo

   Se este valor for negativo, estás a pagar para estar aberto.
   Se for positivo mas muito baixo, podes perguntar: vale o esforço e o impacto na equipa?

3. Analisa o contexto competitivo

   • Concorrência direta abre?

   • És destino de compra por si só ou dependes de fluxo de centro comercial/rua?

4. Decide em ciclo de teste, não para a vida toda

   • Teste de 3 a 6 meses com domingo aberto (ou fechado).

   • Avalias números, equipa e feedback de clientes.

   • Ajustas – inclusive, podes abrir só em épocas específicas (Natal, saldos, verão, turismo).

7. E a parte humana da equação?

Há ainda um lado que não entra na folha de Excel: a vida das pessoas.

A abertura ao domingo pode significar:

• mais oportunidades de trabalho para uns,

• mais pressão sobre quem já está cansado para outros,

• impacto real em famílias com horários desencontrados.

Vários estudos sobre trabalho dominical em contexto europeu sublinham que, mais do que a lei em si, o importante é como as empresas gerem horários, compensações e previsibilidade. Eurofound+1

Nenhum número compensa uma equipa exausta e desmotivada.

Conclusion

Abrir ao domingo não é automaticamente bom nem automaticamente mau.
É uma decisão estratégica que depende de:

• quem é o teu cliente,

• que tipo de loja tens,

• quanto custa realmente estar aberto,

• e o que acontece à tua marca se fores “o único que fecha” ou “mais um que abre”.

O importante é não decidir por reflexo (“toda a gente abre”, “sempre foi assim”) mas sim com:

• dados,

• testes,

• e uma visão clara do que queres para o teu negócio e para a tua equipa.